Lula e o PT, rumo ao divórcio

Lula e o PT, rumo ao divórcio


Divorcio

“Esses dias um companheiro xiita do PT… xiita, não, um companheiro… disse que preferia o Lula de macacão. […] Eu dou o meu macacão de graça a ele trabalhar numa fábrica pra ele saber se é bom. Só fala isso quem não conhece o que é trabalhar de macacão numa telha de Brasilit. Depois do almoço aquela porra esquenta, e você fica suando até 3 horas da tarde.”
Lula, 2002 (http://bit.ly/1WGQf8O)

O PT sempre viveu uma tensão conjugal entre o sindicalismo e o socialismo. O sindicalismo brasileiro nunca foi socialista.

“Na verdade os sindicalistas não tinham posição política nenhuma. Foi o movimento democrático brasileiro – não o MDB; o conjunto da sociedade brasileira – que lutava por uma nova democracia que levou os sindicalistas para a esquerda. Nenhum deles era de esquerda. […] Os sindicalistas foram para esquerda empurrados pelo movimento da sociedade. Se dependesse deles exclusivamente, não haveria movimento de esquerda no Brasil.”
Prof Chico de Oliveira, FFLCH-USP, Roda Viva, 2/07/2012 (youtu.be/SuMOck65cH8)

Lula confirma, narrando do ponto-de-vista do sindicalismo:

“A tradição da esquerda era pegar a juventude intelectualizada e jogá-la pra dentro da fábrica. Era proletarizar o estudante. O PT é a primeira oportunidade da vida em que os operários é que saíram da fábrica para dirigir a política.”
Lula, 2002 (http://bit.ly/1U5z8Hr)

Nasce, então, o casamento entre o sindicalismo e o socialismo brasileiro, em que o sindicalismo aceitou vestir-se do ideário socialista para atingir seus objetivos. Os socialistas só foram cair na real quando Lula chegou ao seu “paraíso”. Só que não.

“O Lula é um oportunista, que a sociedade brasileira, e eu particularmente, como parte da esquerda brasileira, sou responsável, porque nós fizemos de conta que o operário é igual à classe. Como Marx disse, há 150 anos, que a libertação da classe operária só será obra da própria classe operária, nós confundimos as duas coisas. A gente achou que tinha chegado ao paraíso.”
Prof Chico de Oliveira, FFLCH-USP, Roda Viva, 2/07/2012 (youtu.be/SuMOck65cH8)

Lula reconta a mesma história, dessa vez com o MST no lugar da CUT:

“O Sem-Terra, na minha opinião, é um movimento que eu tenho o mais profundo respeito. Acho que é um movimento fantástico. Na minha opinião, quando é que o Sem-Terra começa a ter problemas? Depois da marcha de abril de 97, alguns intelectuais ligados ao Sem-Terra começaram a dizer que o Sem-Terra era o que eles não eram. Qual era a tese defendida por eles? A TESE ERA ABSURDA. A tese era assim: não havia espaço para a esquerda chegar ao poder via eleitoral, e portanto não tinha que ficar preocupada em disputar eleição. Tinha que se pensar em organizar a sociedade. Dali 20 ou 30 anos, a gente ia ter 30% da sociedade já socialista e assim a gente podia disputar o poder e ganhar. Mas eu não vou viver mais 30 anos, e eu quero chegar ao poder logo. O que eu faço com o Olívio Dutra, que vai ser candidato a governador? Eu peço a ele para não ser candidato e ficar organizando a sociedade socialista antes? Ou eu quero que ele ganhe as eleições, que vereadores do PT se elejam, que prefeitos… e a gente vai mudando a relação do Estado com a sociedade, e vai construindo isso. Nunca mais me convidaram para nenhuma reunião.”
Lula, 2002 (http://bit.ly/1WGQl03)

Lula nunca quis mudar sistema algum. Nunca deixou de ser o negociador de sindicato pragmático que sempre foi. Quando Brizola disse isso aos jornalistas do Roda Viva em 1994, eles reagiram como se por um momento o “Comandante” tivesse ficado senil:

“O Lula está dentro do sistema, sua mente está dentro do poder econômico, como a do Fernando Henrique. Só que o Lula vem por baixo, o Fernando Henrique por cima. Eles estão se acotovelando, as duas equipes, para executar o mesmo programa: neoliberal.”
Leonel Brizola, Roda Viva, 1994 (youtu.be/ju9o81Cjutg)

A chegada do Lula à presidência esgarçou esse casamento já tenso entre o sindicalismo e o socialismo dentro do partido. Já em 2002, muitos daqueles que o próprio Lula chama de xiita, saíram do partido. Os partidos socialistas saíram da coligação, e os mais idealistas do PT fundaram o PSOL com Heloísa Helena. Mas a tensão continuou dentro do partido, com outras figuras de maior estatura. Tarso Genro deixa isso bem claro no orçamento de 2014 do seu governo no RS, onde diz:

“Uma indefinição permanece. O novo papel do Estado ou avançará no sentido de iniciar uma transição ao socialismo ou ficará restrito a uma reforma do capitalismo que fortaleça a autonomia de suas burguesias nacionais e promova sua ascensão à situação de competidoras no cenário mundial a partir da consolidação, com o apoio de seus governos, da condição de “campeões” empresariais regionais.”

No governo federal, não há “indefinição” alguma; o modelo é o (2): neodesenvolvimentismo. É o modelo que a tão admirada Coréia do Sul adotou já na década de 70, quando também era uma ditadura, criando os seus “campeões nacionais” – Samsung, Subaru, Hyundai, LG… – empresas de dinastias familiares, lá chamadas de chaebols.

Talvez neste ponto, Brizola errou, se por “neoliberal” se referia ao Consenso de Washington. Porém, quanto às políticas sociais, não poderia estar mais certo. Bolsa Família, Prouni, Pronatec, MCMV… são todas políticas públicas retiradas da liturgia liberal, de autores como Friedman, Hayek e Rhyss-Williams. Concessões de exploração de estradas, aeroportos e poços de petróleo também. Estas todas são políticas que os xiitas do PT abominam chamando-as, muito apropriadamente, de social liberais. Lula é categórico acerca do seu liberalismo:

“Eu não quero um Estado gerenciador; eu não tenho vocação para um Estado empresarial [socialista]. Eu tenho vocação para um Estado indutor [neodesenvolvimentista] e fiscalizador [neoliberal].”
Lula, documentário Presidentes da América Latina, 2009 (youtu.be/wMDvvjJ6rxM)

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